A Lei nº 14.148/2021 (Lei do Programa de Recuperação do Setor de Eventos – PERSE) instituiu benefício fiscal de alíquota zero de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS pelo prazo de 60 meses. Para tanto, adotou critério subjetivo, ou seja, relacionou as pessoas jurídicas que considerava enquadradas no setor de eventos, não restringindo o benefício somente às receitas e resultados oriundos das atividades ligadas ao setor.
Pela redação original da Lei do PERSE, as empresas (e não determinadas receitas ou resultados) beneficiadas estavam a salvo de tributação por cinco anos. Assim, inclusive outras atividades desempenhadas pela empresa e não ligadas estritamente ao setor de eventos também fariam jus ao benefício fiscal. Essa foi a opção do legislador no caput do art. 4º da Lei nº 14.148/2021.
A Receita Federal do Brasil, porém, editou a Instrução Normativa (IN RFB) nº 2.114/2022 transformando o critério subjetivo adotado pela Lei em objetivo. A IN, ao arrepio da lei, previu que somente as receitas e resultados decorrentes das atividades cujos CNAEs estivessem listados na Portaria nº 7.163/2021 do Ministério da Economia poderiam usufruir do benefício de alíquota zero. A título de exemplo, uma empresa de segurança privada, pela Lei, teria a totalidade de suas receitas e resultados sem tributação por cinco anos. Pela regra da Receita Federal, somente os resultados e receitas decorrentes de atividades de segurança privada para eventos fariam jus à alíquota zero.
Mais recentemente, foi editada a Medida Provisória (MP) nº 1.147/2022, reduzindo o escopo do benefício fiscal do PERSE nos mesmos termos da ilegal IN RFB nº 2.114/2022. A MP alterou o caput do art. 4º da Lei do PERSE e introduziu o § 1º, o qual dispõe que “para fins de fruição do benefício fiscal previsto no caput, a alíquota de 0% (zero por cento) será aplicada sobre as receitas e os resultados das atividades do setor de eventos de que trata este artigo”.
A natureza restritiva da nova regra trazida pela MP nº 1.147/2022 foi, inclusive, atestada pela própria Receita Federal na Solução de Consulta COSIT nº 52/2022. Assim, perde completamente o sentido a tese de que a IN RFB nº 2.114/2022 seria interpretativa. Foi, na verdade, tentativa frustrada de limitar um benefício previsto em lei.
A par das discussões que envolvem a necessidade de respeito ao prazo e à extensão originalmente previstos para o benefício do PERSE por conta da incidência, no caso, do art. 178 do CTN (irrevogabilidade de benefícios concedidos por prazo certo e condicionados), devem os contribuintes atentar para o fato de que a mudança legislativa promovida pela MP necessita respeitar regras constitucionais ligadas à preservação da segurança jurídica e da não surpresa dos contribuintes.
Para CSLL, PIS e COFINS, a mudança somente terá efeitos a partir do final do prazo relativo à anterioridade nonagesimal, aplicável às contribuições por força do art. 195, § 6º, da Constituição Federal. Isto é, o retorno da tributação passa a valer somente a partir de 1º de abril de 2023.
De outro lado, para o IRPJ, a mudança somente terá efeitos a partir de 2024. Isso porque o art. 62, § 2º, da Constituição Federal prevê que as medidas provisórias que impliquem majoração do imposto sobre a renda (e não há dúvida de que a reinstituição de um tributo equivale a sua elevação) somente produzirão efeitos no exercício financeiro seguinte àquele em que editadas se forem convertidas em lei até o último dia do mesmo exercício financeiro. No caso, não tendo a MP nº 1.147/2022 sido convertida em lei em 2022, ela só produzirá efeitos em relação à majoração da alíquota de IRPJ para as empresas do setor de eventos no ano de 2024 (considerando, claro, que o Congresso aprove a MP e a converta em lei em 2023).
Assim, os contribuintes enquadrados na definição legal original do setor de eventos poderão usufruir do benefício fiscal para a totalidade de suas receitas e resultados pelo menos até 1º de abril de 2023 para as contribuições sociais (CSLL e PIS/COFINS) e, relativamente ao IRPJ, até 31/12/2023.
Caso não seja esse o entendimento do Fisco Federal, restará aos contribuintes, mais uma vez, buscar a tutela jurisdicional para garantir a fruição desse direito que sobressai cristalino do texto constitucional.
Gustavo Nygaard, sócio na área de Tributário de TozziniFreire Advogados
Eduardo Gonçalves Spitaliere, advogado na área de Tributário de TozziniFreire Advogados