A regulamentação da reforma tributária está cada vez mais próxima e promete trazer mudanças significativas para a economia. Nos últimos meses, acompanhei diversos debates e audiências sobre o tema, que movimenta (e como movimenta) todos os setores da sociedade civil. Os impactos ocasionados pelo novo sistema devem ser notados tanto por consumidores finais quanto pelas empresas (principalmente por elas).
O texto aprovado prevê mudanças importantes na constituição, unificando tributos e simplificando a definição das alíquotas, além de trazer sugestões na direção de simplificar o recolhimento desses tributos. As empresas ansiavam há muito tempo por essa simplificação, dado que a complexidade tributária traz um custo de gestão estimado em R$60 bilhões por ano (de acordo com pesquisa do Banco Mundial).
A ideia desse artigo não é entrar nos detalhes dos conceitos propostos pela reforma, tema amplamente discutido em diversos fóruns, mas sim discutir os principais impactos para as empresas.
Para os desavisados, em resumo, a reforma prevê a unificação das alíquotas do ICMS, ISS, PIS e COFINS em um IVA dual - IBS (Imposto sobre Bens e Serviços, repassado a estados e municípios) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços, de competência da União), além do IS (Imposto Seletivo sobre produtos e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente).
As alíquotas serão unificadas por setor, havendo cobrança reduzida em 60% para determinados setores (como saúde, educação etc), 30% para serviços de natureza intelectual/científica e 100% para alguns outros segmentos.
Obviamente, a reforma não irá agradar a todos. Quase todos os setores terão mudanças em suas cargas tributárias, alguns para mais e outros para menos. Como não poderia deixar de ser, os diversos segmentos da economia travam uma batalha pelo enquadramento às faixas "descontadas" das alíquotas de cada imposto, batalha esta que parece longe do fim e que provavelmente irá perdurar por anos.
As áreas jurídicas das empresas já se movimentam para garantir, contratualmente, que um eventual aumento da carga tributária seja repassado aos clientes. As áreas financeiras já simulam como eventuais variações da carga tributária (suas e de seus fornecedores) irão impactar na lucratividade dos negócios, traçando curvas que dependem da capacidade de repassar ou não a nova carga.
Nas áreas fiscais de empresas de todo o Brasil, das quais estou bem próximo, a reforma tributária desperta algumas preocupações. A primeira delas é que, como a mudança de sistema será gradativa, as empresas terão que conviver com ambos os modelos tributários até 2032, dado que a substituição efetiva do modelo atual se dará apenas em 2033. Assim, em vez de simplificar, a reforma irá dificultar a vida da área fiscal e tributária até 2032, com a necessidade de verificação fiscal de acordo com os dois modelos, duas apurações de impostos diferentes etc. Isso acarretará em mudanças de processos e, principalmente, de sistemas internos.
O ERP precisará mudar para armazenar as novas alíquotas, a solução fiscal terá que considerar os novos impostos no fechamento, o faturamento deverá emitir as notas fiscais da empresa considerando os novos tributos e alíquotas e as soluções de automação do inbound de notas fiscais terão que se adequar ao novo leiaute das notas.
Falando especificamente em relação ao inbound de notas fiscais, que é a minha praia, as mudanças serão bastante benéficas após 2033. Estou ansioso para viver essa tão sonhada simplificação.
Adeus aos complexos "motores de cálculo" de impostos. Adeus (prometido, embora eu tenha grande desconfiança) às obrigações acessórias. Adeus aos milhares de templates e robôs de captura de notas fiscais de serviços. Adeus aos milhares de cenários diferentes de creditação tributária.
Enfim, a simplificação trará muitas vantagens para todos os profissionais de gestão fiscal. Poderemos deixar de investir em soluções para driblar a complexidade e focar apenas no que gera valor, de fato, aos nossos clientes: a otimização de seus pagamentos a fornecedores (automação e melhoria contínua do processo, gestão, relacionamento com fornecedores, integração entre as diversas áreas internas participantes do processo etc).
Até 2033, porém, estaremos comprometidos com a missão de suportar nossos clientes nessa travessia com o mínimo de turbulência possível. Isso envolverá mudanças tempestivas no processo de inbound de notas fiscais, tais como:
Captura das notas fiscais da nova fonte (principalmente notas fiscais de serviços);
Mudança na leitura das notas fiscais, para considerar os novos leiautes que, no mínimo, irão incluir as alíquotas dos novos tributos;
Validação das alíquotas dos novos tributos (e dos antigos, considerando sua redução gradual);
Mudança nas integrações com os ERPs para permitir o registro das alíquotas de todos os novos tributos.
Quando for concluída, a reforma tributária deve simplificar o trabalho dos profissionais da área fiscal e proporcionar mais clareza à sociedade. Até lá, no entanto, deve trazer grandes desafios para as áreas fiscais. Geralmente, antes da tempestade vem a calmaria. No caso do Brasil em período de transição para a reforma, será exatamente o contrário.